
Nem sei bem como tudo aconteceu…. Como é que duas linhas fraquinhas, cada uma de sua cor, se envolveram uma na outra, se enrolaram e embrulharam para formar um novelo grande e complicado?
As nossas linhas, a minha laranja – vibrante de entusiasmo e criatividade – e a tua preta – carregada de mistério e formalidade – sempre estiveram muito perto, desenhando lado a lado histórias diferentes, intricadas e indecifráveis.
Mas demoraram tanto para se cruzar…
As linhas laranja e preta sempre tiveram muito juntas e nunca soubemos disso - ou pelo menos eu não o soube. Tocaram-se levemente numa mão cheia de ocasiões, mas de uma forma ou de outra acabaram sempre afastadas, espaçadas pelos caprichos do destino. Em ti nunca vi a linha preta como em mim nunca viste a linha laranja. Não era o momento - não nos víamos um ao outro porque não era assim que tinha de acontecer.
Mas o destino é como um gato manhoso, atraído pelas linhas dos novelos de lã colorida!
Não sei se estava distraído ou apenas entediado e com vontade de se divertir quando uniu as nossas linhas que por tanto tempo mantive afastadas.
A verdade é que me lembro perfeitamente do dia em que as nossas linhas deram o primeiro nó. Envergonho-me disso porque nunca decidi guardar essa memória. Mas não posso negar que me lembro que quando te vi pela primeira vez – ou assim eu achava, não me recordando que já tinha olhado para ti uma centena de vezes – tinhas na face uma expressão meio perdida e atarantada mas os teus olhos brilhavam de satisfação.
A minha linha laranja sempre teve tendência para ficar enrodilhada e embaraçada, prendendo entre nós fortes detalhes insignificantes - como a cor da tua camisola ou os ténis azuis que calçavas.
E eu não sabia mas esse primeiro nó era o princípio desordenado de um novelo preto e laranja. Um nó aqui, um nó ali e quando dei por mim estava mais presa em linha preta do que podia desejar. Sacudi-me em todas as direcções, esbracejei e esperneei e a linha preta saltou para longe, para um lugar onde não me podia mais tocar.
Era assim que eu queria viver… uma vida ditada por uma linha laranja vibrante e não por um enrodilhado de linha preta e laranja. E os esforços que fiz para desembaraçar a linha laranja da linha preta deram ao destino a oportunidade de atar a minha linha com outra de outra cor. Era uma linha verde, fraquinha, que em vez de exultar esperança e frescura se dobrava numa rede fina de segurança que não me deixava ficar sozinha. E era isso que eu precisava, de companhia e segurança. Mas como uma hera selvagem, alinha verde enrolou-se em mim, sufocando-me, apagando-me, esbatendo o meu laranja até que eu própria não passasse de um fio fraco e verde pálido.
E como é que as nossas linhas se voltaram a cruzar?
Pergunta ao destino, esse que mistura linhas para formar padrões disparatados.
Quando dei por mim não era apenas mais uma linha laranja que preenche o mundo. Quando reparei estava novamente entrançada presa em linha negra e desta vez não quis fugir.
E eu não espero que te revejas numa simples linha negra porque podes nem o ser – talvez sejas de um amarelo brilhante ou vermelho vivo - mas para mim serás sempre um emaranhado negro de mistério e sensualidade, que se exprime apenas através de um olhar do mais brilhante azul que alguma vez vi.
Também não peço que desfaças os nós que nos unem… mas pelo menos afasta-te dos meus sonhos, permite-me que me mantenha sã ou não saberei enfrentar o amanhã.
Deixa-me dormir em paz, sem ter de ouvir a tua voz forte ou olhar os teus olhos brilhantes cada vez que fecho os meus.
É tudo o que mais desejo, é tudo o que penso nestes últimos três dias - depois que passaste a povoar os meus sonhos sem pedir permissão.
Então adeus… até breve…
… até ao dia em que as nossas linhas se atem se novo ou se descruzem de vez...
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